O croquizeiro e suas aquarelas: Fabiano Vianna
Nosso entrevistado desta semana é o curitibano Fabiano Vianna, formado em Arquitetura e Urbanismo pela PUC-PR, que, influenciado pela subjetividade da arte, design e literatura foi levado para outros caminhos, para a nossa sorte é claro!
Participa dos coletivos “Urban Sketchers” e "Croquis Urbanos", grupos que vão às ruas para desenhar e descrever a cidade in loco. Fabiano sente-se à vontade desenhando nossa cidade e hoje sua arquitetura é expressa em forma de ilustrações, que podem acontecer a qualquer momento, bastando que o seu olhar atento observe algum detalhe na rua, no casario descorado pelo tempo, ou na própria cena captada para “croquisar”.
Seus croquis como são chamados, mas que, com certeza, poderiam ser chamados de ARTE, vieram para encher nossos olhos com cores quentes, traços marcantes, representando um instante ou algo que neste momento pode não existir mais. Só mesmo a memória para nos fazer lembrar aquele casario, os detalhes de lambrequins que hoje não conseguimos ver com frequência.
Como é chamado pelos amigos, nosso Croquerine curitibano, respondeu algumas perguntas para o Blog It Rab.
Blog It Rab - Lendo uma matéria sobre você, vi que admira Curitiba, mesmo com a chuva e a neblina que podem servir como um cenário perfeito para textos e crônicas, clima ideal para escritores, vampiros e café coado. Mas devo lembrá-lo do nosso "leitE quentE", não é mesmo? Com este cenário, você se considera um Vampiro de Curitiba? Ou Piá curitibano?
Fabiano Vianna - Talvez eu seja uma mistura de piá com vampiro. Lobisomem das aquarelas. Hahaha. Lembro bem de uma revista literária chamada LeitE QuentE, e adorava esse detalhe dos “Es” em maiúscula no final. – “Editada por Maí Mendonça, na época, diretora de Patrimônio Cultural na Fundação Cultural de Curitiba e contava sempre com um assunto que norteava um ensaio escrito por um ou mais convidados, quase sempre de forma descontraída e linguagem coloquial, dialogando com o leitor como em uma conversa casual em que um morador da cidade apresenta as excentricidades aos visitantes.”
Blg It Rab - Sobre a experiência de desenhar nossa cidade, que detalhes você tenta captar para representá-la? Quando você desenha, que Curitiba você busca?
Fabiano Vianna - Sempre digo que, para mim, desenhar a urbe é como fazer uma crônica gráfica. Representar aquele instante, apreender aquele espaço de tempo. Os personagens, as cenas, os objetos, mobiliários, acontecimentos inusitados. No fundo estou sempre escrevendo histórias, mesmo quando desenho.
A literatura de Dalton Trevisan me ensinou isso. Acredito existir milhares de Curitibas. Cada um vê e vive uma Curitiba diferente. Acho que todas as cidades são assim. Muitas cidades dentro da outra. Como aquela boneca russa – a Matrioska.
Dalton escreveu anos e anos sobre Joãos e Marias. São sempre os mesmos? As mesmas histórias contadas de diversas maneiras diferentes. E ele escreve sobre a Curitiba dele. Praticamente um simulacro.
Quando caminho pelas ruas, ou desenho a cidade, busco esta cidade interna, labiríntica. Não a Curitiba onde predominam as linhas retas, mas a Curitiba das linhas curvas. Deformadas e embaçadas pela memória.
Blg It Rab - Nas suas circuladas por Curitiba, o que você acha que mudou na cidade, desde que começou com suas ilustrações?
Fabiano Vianna - Algumas casas foram demolidas e outras mudaram de atuação. O tempo não pára e a cidade é fluída. O café da esquina da Cândido Lopes mudou de nome, uma vila de casas de madeira na Vista Alegre não existe mais, o Belvedere pichado foi restaurado, os bancos mudaram de nome (e de donos), alguns personagens mudaram de cidade, o mural do Poty da Rua XV está cada vez mais apagado e o da São Francisco muda a cada instante, o restaurante Mikado da São Francisco não existe mais.
O mais triste é ver esta cidade do passado sendo apagada com borracha, quando deveria ser preservada. Elas fazem parte da história de nossos antepassados e deveriam continuar por aí. E a cidade moderna que cresça em volta e com respeito. E não falo só das construções clássicas, neoclássicas, art déco, art nouveau, mas da arquitetura modernista e principalmente as casinhas de madeira de nossos imigrantes também!
Fizemos um levantamento de casas de lambrequins para desenharmos durante o 1º Encontro Nacional de “Urban Sketchers Brasil” e existem muito poucas! A maioria já desapareceu! É muito triste isso!
Blg It Rab - Existe algum trabalho com o qual você mais se identifique? Por quê?
Fabiano Vianna - Gostei muito de aquarelar a Rua Desembargador Ermelino de Leão, vista do terraço da Casa Samambaia.
Escrevi esta crônica para ela:
Inúmeras vezes cruzei a Rua Ermelino de Leão, essa do desenho.
Algumas delas na época que tinha um escritório do Edifício Tijucas; indo e vindo da XV. Vindo ou indo pra casa.
Às vezes, no intuito de traçar uma imensa e suculenta pizza sabor queijo grossona na Pizzaria Itália. (E para beber aquela vitamina rosa também, claro).
Fiz este desenho do terraço da Casa Samambaia – projeto da brother Bruna Castro, que habita, vivencia e compartilha o espaço, na cobertura do lindo Edifício Anita.
Tantas vezes me imaginei (como a maioria dos andarilhos curitibanos do centro), morando nela. Num dos delírios mais loucos, conjecturei possuir um bicho bem exótico e pescoçudo – tipo uma lhama ou um avestruz, na área externa, para que pudesse ser visto da rua.
O espaço interno é lindo e, lá de cima é possível ver e desenhar o movimento da cidade. Os rasantes dos pássaros, o ziguezague dos pedestres, as curvas dos táxis altamente laranjas...
A Ermelino não é mais a mesma desde a época que habitei o Tijucas.
Até a luz mudou.
A cidade se modifica como o sol – e lambe as faces dos prédios da XV de maneira diferente a cada hora do dia. E de maneira diferente a cada ano.
Lembro-me de um mendigo que tomava banho na água que escorria da calha do Hotel Del Rey em dias de chuva, o som dos gritos dos chineses e japoneses jogando futebol na Praça Osório nos sábados de manhã, o som das rodinhas das aeromoças da TAM e da GOL que desciam de seus furgões na Ermelino, da algazarra dos travestis na esquina da Carlos de Carvalho...
E há quem diga que, em determinadas horas do dia, ainda é possível ouvir o saxofone do man que se apresentava gratuitamente para os citadinos – numa das janelas da parte de baixo do Tijucas, em frente ao Largo Frederico Faria de Oliveira.
Eu acredito!
Também gostei muito da aquarela que fiz da XV, vista pela janela de uma casa de sucos. E de uma série que fiz na Ilha do Mel, no final do ano. Aquarelas bem coloridas e tropicais, fruto do clima delicioso de férias, com pigmentos mesclados com água salgada do mar.
Blg It Rab - Além de ilustrador, você ainda acha tempo para escrever, (vi alguns textos e ilustrações da revista Lama são ótimos!) O que o inspira a escrever? Terá uma nova revista?
Fabiano Vianna - Sim, sempre gostei de escrever. Uma época até cogitei ser só escritor. Mas daí surgiu a prática dos “urban sketchers” me trazendo para o desenho/arte/ilustração com tudo de novo. E como disse, sinto que em algumas vezes escrevo desenhando.
A Lama era uma publicação de histórias pulp – que abrangia histórias de suspense, terror, ficção científica, aventura e fantasia. Fazia também fotonovelas. Mas tudo isso está engavetado. Algumas histórias ainda podem ser lidas por aí, em blogs flutuantes e sites underground. Heheh
Penso em passar o bastão para alguns amigos. Talvez eles queiram continuar a ideia.
Hoje em dia sobra pouco tempo. A obsessão de pintar acaba dominando. Para melhorar é preciso pintar muito, uma atrás da outra. Errar muito, para acertar algumas. É como tocar piano ou jogar basquete.
Por fim, Fabiano Vianna, sendo um vampiro de Curitiba ou um Piá curitibano, consegue expressar em suas ilustrações uma cidade, sua cultura e sua gente e ainda contar histórias de diversas maneiras, mostrando o quanto nossa cidade precisa e pode ser explorada artisticamente.
As imagens contidas neste texto foram cedidas pelo artista ou retiradas dos links abaixo.
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